segunda-feira, maio 31, 2004
Paul McCartney
Quando eu era miúdo... Mesmo muito miúdo... Comprar um disco era um luxo. Um single, ainda se conseguia cravar às avós no Natal. Mas um LP era coisa para meninos ricos. Cheques disco era coisa que só alguns iluminados, principalmente aqueles que tinham irmãos mais velhos, é que tinham acesso. Mais do que isso, quando se comprava um single tinha-se a certeza que se estava a investir numa música de que se gostava. Comprar um LP era um risco. E se só se ouvi uma música? Se as outras não valessem nada?
Tudo bem... Eu sei que isto não acontecia a toda a gente. Mas no meu núcleo de amigos era assim que a gente pensava as coisas... Mas também... Só tínhamos 9 anos...
Quando disse ao meu pai que queria o LP «Give my regards to Broad Street» ele olhou para mim e perguntou: «Tens a certeza»? Eu anui. A empregada da loja de música do Apolo 70 retirou o disco do escaparate e entregou-mo, sem saco nem nada. O dinheiro dos anos foi entregue... Na altura, um LP devia custar para aí 800 escudos...
Cheguei a casa e ouvi-o horas seguidas. Como seria de esperar, risquei-o rapidamente, mas só em zonas que não faziam mossa!.
Aprendi a falar inglês e a entendê-lo como segunda língua por causa daquele álbum. Devo tê-lo plagiado em composições centenas de vezes. Frases feitas que saídas de uma música encaixavam na perfeição no final de um texto sobre o que quer que fosse...
A doença agravou-se. Tornei-me fã do Mccartney Beatle, do McCartney Wings e do McCartney Solo. Em 1989 fiquei a ver partir os autocarros com o Marcelo Rebelo de Sousa e mais 100 privilegiados que foram a Madrid ver um dos primeiros concertos ao vivo, em mais de 20 anos... E tive inveja... Muita inveja.
Quando na sexta feira entrei no recinto do Rock in Rio, todas estas ideias ecoavam na minha cabeça. A paixão não é a mesma, é certo. Não comprei sequer o último álbum para não ter de admitir que a fonte secou e que salvo raras excepções, o Paul McCartney não faz uma música decente há pelo menos 5 anos. Mas estar a 15 metros daquele homem. Ouvir aquelas músicas. Ser parte integrante daquele espectáculo. Era um sonho tornado realidade.
Fui com a minha mulher, depois de muito ponderar se o devia fazer ou não. Sabia que, tratando-se do Paul McCartney, poderia estar inclinado a fazer maluquisses, como esperar de pé mais de três horas pelo início do concerto, só para guardar um lugar nas primeiras filas... E não a queria obrigar a esse sacrifício. Mas ela aguentou, estoicamente, e até gosto muito do espectáculo.
Pois é... Estava tudo perfeito, o sonho a tornar-se realidade, eu e ele ali, a 15 metros um do outro, a entoar o «Yesterday»... E em quem é que eu penso? No meu filho.
Tinha-o deixado em casa dos avós e naquele momento, que devia ser de êxtase total, só quero saber se ele está bem, se não bateu com a cabeça num móvel, se comeu bem, se já está a dormir. Felizmente há telemóveis. Liguei e dei ao meu pai o prazer de ouvir os primeiros acordes do «Drive my car», ao vivo! Grande subterfúgio! E no entretanto, fiquei a saber que estava tudo bem com o meu filhote... Tudo normal... E o concerto continuou por mais uma hora...
Gostei muito... Mas a magia já não está lá... Aquela parte do meu coração onde eu guardava as músicas do Paul McCartney, os dribles do Platini e as curvas à chuva do Ayrton Senna, tem outro morador... Ou melhor... O morador anexou todas as partes do meu coração disponíveis e enche-as diariamente... O McCartney não tem a culpa... O meu filho é que está a crescer...
Tudo bem... Eu sei que isto não acontecia a toda a gente. Mas no meu núcleo de amigos era assim que a gente pensava as coisas... Mas também... Só tínhamos 9 anos...
Quando disse ao meu pai que queria o LP «Give my regards to Broad Street» ele olhou para mim e perguntou: «Tens a certeza»? Eu anui. A empregada da loja de música do Apolo 70 retirou o disco do escaparate e entregou-mo, sem saco nem nada. O dinheiro dos anos foi entregue... Na altura, um LP devia custar para aí 800 escudos...
Cheguei a casa e ouvi-o horas seguidas. Como seria de esperar, risquei-o rapidamente, mas só em zonas que não faziam mossa!.
Aprendi a falar inglês e a entendê-lo como segunda língua por causa daquele álbum. Devo tê-lo plagiado em composições centenas de vezes. Frases feitas que saídas de uma música encaixavam na perfeição no final de um texto sobre o que quer que fosse...
A doença agravou-se. Tornei-me fã do Mccartney Beatle, do McCartney Wings e do McCartney Solo. Em 1989 fiquei a ver partir os autocarros com o Marcelo Rebelo de Sousa e mais 100 privilegiados que foram a Madrid ver um dos primeiros concertos ao vivo, em mais de 20 anos... E tive inveja... Muita inveja.
Quando na sexta feira entrei no recinto do Rock in Rio, todas estas ideias ecoavam na minha cabeça. A paixão não é a mesma, é certo. Não comprei sequer o último álbum para não ter de admitir que a fonte secou e que salvo raras excepções, o Paul McCartney não faz uma música decente há pelo menos 5 anos. Mas estar a 15 metros daquele homem. Ouvir aquelas músicas. Ser parte integrante daquele espectáculo. Era um sonho tornado realidade.
Fui com a minha mulher, depois de muito ponderar se o devia fazer ou não. Sabia que, tratando-se do Paul McCartney, poderia estar inclinado a fazer maluquisses, como esperar de pé mais de três horas pelo início do concerto, só para guardar um lugar nas primeiras filas... E não a queria obrigar a esse sacrifício. Mas ela aguentou, estoicamente, e até gosto muito do espectáculo.
Pois é... Estava tudo perfeito, o sonho a tornar-se realidade, eu e ele ali, a 15 metros um do outro, a entoar o «Yesterday»... E em quem é que eu penso? No meu filho.
Tinha-o deixado em casa dos avós e naquele momento, que devia ser de êxtase total, só quero saber se ele está bem, se não bateu com a cabeça num móvel, se comeu bem, se já está a dormir. Felizmente há telemóveis. Liguei e dei ao meu pai o prazer de ouvir os primeiros acordes do «Drive my car», ao vivo! Grande subterfúgio! E no entretanto, fiquei a saber que estava tudo bem com o meu filhote... Tudo normal... E o concerto continuou por mais uma hora...
Gostei muito... Mas a magia já não está lá... Aquela parte do meu coração onde eu guardava as músicas do Paul McCartney, os dribles do Platini e as curvas à chuva do Ayrton Senna, tem outro morador... Ou melhor... O morador anexou todas as partes do meu coração disponíveis e enche-as diariamente... O McCartney não tem a culpa... O meu filho é que está a crescer...
Primeiros passos
Um pequeno passo para a Humanidade, mas um grande passo para os pais. O meu filho começou a andar.
Fez 15 meses e achou que não valia a pena gatinhar mais. As crianças são mesmo assim. Quando menos se espera surpreendem-nos. O primeiro passo, quer dizer, o oficial, foi dado à frente da mãe, e de uns amigos. Privilegiados espectadores da maior façanha que o meu miúdo de 15 meses realizou, desde que disse «Paííí», com muitos assentos no Í!
Em menos de um segundo deixei de ter um bebé e passei a ter o que os americanos apelidam de «toddler», ou seja, qualquer entre o miúdo e o puto, mas com pronúncia da Virgínia do Norte!
Agora começa uma nova fase. A do retirar-lhe da frente os obstáculos e fechar os olhos às tangentes desenhadas aos móveis, às esquinas, às paredes... E de muito sangue frio para o apanhar do chão e não o cobrir de beijos de cada vez que ele cai. Não lhes podemos mostrar que a cada queda o nosso coração se parte, senão quando quiserem a chave do carro desatam a atirar-se para o chão... E como se sabe, o único que consegue o que quer quando se atira para o chão é o João Pinto... E mesmo esse vai sair do Sporting!
Diziam-me os entendidos, ou seja, os outros pais que já passaram por isto, que quando eles começam a andar é que é! Diziam-no com um sorriso malicioso, do tipo «Achas que foi difícil até aqui? Não perdes por esperar!». E eu engolia em seco e tentava convencer-me que não era nada assim. Que o meu filho, assim que começasse a andar, ia dominar a técnica perfeitamente e que já não me tinha que preocupar com andar atrás dele a ampara-lhe as quedas. Bem... Essa fase, de facto, melhorou... Mas... Ele é rápido... E quando mete a primeira e arranca... Enfim... Fui promovido de pára quedas a polícia sinaleiro... Infelizmente, o filho sai ao pai e não respeita a autoridade.
Fez 15 meses e achou que não valia a pena gatinhar mais. As crianças são mesmo assim. Quando menos se espera surpreendem-nos. O primeiro passo, quer dizer, o oficial, foi dado à frente da mãe, e de uns amigos. Privilegiados espectadores da maior façanha que o meu miúdo de 15 meses realizou, desde que disse «Paííí», com muitos assentos no Í!
Em menos de um segundo deixei de ter um bebé e passei a ter o que os americanos apelidam de «toddler», ou seja, qualquer entre o miúdo e o puto, mas com pronúncia da Virgínia do Norte!
Agora começa uma nova fase. A do retirar-lhe da frente os obstáculos e fechar os olhos às tangentes desenhadas aos móveis, às esquinas, às paredes... E de muito sangue frio para o apanhar do chão e não o cobrir de beijos de cada vez que ele cai. Não lhes podemos mostrar que a cada queda o nosso coração se parte, senão quando quiserem a chave do carro desatam a atirar-se para o chão... E como se sabe, o único que consegue o que quer quando se atira para o chão é o João Pinto... E mesmo esse vai sair do Sporting!
Diziam-me os entendidos, ou seja, os outros pais que já passaram por isto, que quando eles começam a andar é que é! Diziam-no com um sorriso malicioso, do tipo «Achas que foi difícil até aqui? Não perdes por esperar!». E eu engolia em seco e tentava convencer-me que não era nada assim. Que o meu filho, assim que começasse a andar, ia dominar a técnica perfeitamente e que já não me tinha que preocupar com andar atrás dele a ampara-lhe as quedas. Bem... Essa fase, de facto, melhorou... Mas... Ele é rápido... E quando mete a primeira e arranca... Enfim... Fui promovido de pára quedas a polícia sinaleiro... Infelizmente, o filho sai ao pai e não respeita a autoridade.