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sexta-feira, março 26, 2004

Avós vs. Pedriatra: a batalha interminável 

No livro do Benjamin Spock, «Meu filho, meu tesouro» há uma frase, logo nas primeiras páginas, que define parte do que é ter um filho e ter de conviver com a abordagem famíliar a esse filho. É um aviso à pré-mamã: «A partir de agora, a sua pior inimiga é a sua irmã mais velha», diz o mestre. A frase, adaptada aos recém pais, deveria ser: «A partir de agora, os vossos piores inimigos vão ser as avós».
A questão é simples. As recém-avós sabem tudo. E não admitem que os recém-papás possam dominar a arte de cuidar de uma criança. Começa logo nos primeiros dias. O bebé está muito vestido e tem calor, ou está pouco vestido e vai apanhar frio. Se chora é porque tem fome e a desnaturada da mãe se esqueceu de lhe dar de comer, ou porque tem a fralda suja e o desnaturado do pai não a mudou.
Isto quando as avós dão alguma importância ao pai... Porque na maior parte das vezes são elas as principais segregadoras do pai, por muito dedicado que este seja.
Mas a verdadeira batalha, que se inicia logo nos primeiros meses, trava-se entre as avós e os pediatras. E aqui, as coisas tornam-se mais sérias... E mais feias.
Se fizerem como eu, e optarem por uma postura tipo «serviço pós venda», vão confiar inteiramente no pediatra. Afinal, ele é que viu o vosso filho nos primeiros segundos de vida, é que lhe aspirou as vias respiratórias. É ele o homem do estetoscópio, que sabe identificar os sinais de alarme. Por isso deve ser ele a vigiar e cuidar da saúde e do desenvolvimento do bebé.
Mas as avós, que conseguiram criar um homem e uma mulher saudáveis e capazes de procriar, acham que o homem da bata branca não passa de um charlatão. Que não faz nada bem. No tempo delas é que era...
Pois... Mas no tempo delas o médico receitava leite em pó para adultos, mercúrio cromo para as feridas e aspirinas para baixar a febre. Entretanto descobriu-se que o leite em pó não era indicado para todos os bebés, que o mercúrio cromo é venenoso e que a aspirina pode causar a morte do recém nascido... Mas as avós já não leram essas notícias, nós já tínhamos 18 anos e os problemas eram outros.
Por isso, postas perante o enorme desafio de terem um neto, vão buscar a velha cassete e toca de querer à viva força que as coisas sejam como eram no tempo delas.
É óbvio que está instalado o campo para um braço de ferro complicado. O pediatra, qualquer pediatra, não tolera intromissões no seu trabalho e tem uma frase lapidar: «Se assumir a responsabilidade pode dar-lhe o que entender, fazer como quiser» E os recém-pais, em pânico, divididos entre o saber materno e o saber da ciência, ficam sem saber o que fazer.
Por mais que lhes expliquemos as avós não percebem que a sua ajuda é inestimável, mas os seus conselhos só atrapalham. Elas são um elo muito importante para a criança. Mas não podem exacerbar essa função e querer impôr a sua vontade.
E por muito que digam, não se podem esquecer que para os pais, criar a criança já é uma tarefa suficientemente envolvente, estafante e desafiante, para ainda terem de estar a reeducar duas avós histéricas.
Até porque, há coisas que só as avós é que sabem fazer... Como bolos, casacos de malha, histórias em dias de chuva e bifes com ovo estrelado. E que as tornam inesquecíveis...

Na «Pais e Filhos» 

A propósito do post de cima... A Pais e Filhos publica este mês, edição de Abril, um artigo da Helena Viegas sobre este tema universal. «Bebés: Mitos, modas e realidades» é o título. Vale uma leitura.

quinta-feira, março 25, 2004

Bem vindo João Ervilha! 

Uma amiga acaba de ter um João. Após 15 horas de esforço. Sê bem vindo João, valeu a pena a luta! Este é o mundo. Planeta Terra para os amigos. Vais gostar disto. Apesar de as coisas nem sempre correrem bem, é um sítio óptimo para se nascer. E ainda por cima, os homens, a espécie a que pertences inventaram uma coisa chamada Amor... Foi desse amor que tu nasceste. E é esse Amor que te vai acompanhar ao longo da vida. Vais vê-lo no sorriso do teu pai, nas lágrimas de emoção da tua mãe, nos beijos das tuas avós... E ainda não sabes, mas já tens montes de amigos. Por isso, força João! Isto ainda agora começou! E vai ser muito divertido!
PS: Beijinhos para os papás...

40 euros em chuchas 

OK... Os pais recentes estão entre os maiores consumidores mundiais de coisas inúteis. Mas há limites. Gastei 40 euros em chuchas e tetinas para o meu filho! Acham normal?! 40 euros em pouco mais que 10 porções mínimas de borracha!
Tudo bem, a borracha é da verdadeira. Mas mesmo assim...
Estou a imaginar um seringueiro da Amazónia a retirar a seiva de uma árvore da borracha secular e a dizer para o companheiro de trabalho:

Seringueiro1: «Ó xente... Essa daí vai para fazer uma chupeta!»
Seringueiro 2: «Xupeta? Sê tem a certeza?»
Seringueiro 1: «Duvide, não! Essa daí é da borracha de primeira...»
Seringueiro 2: «Se é da de primeira vai fazer é camisinha!»

Enfim... Por muito trabalho que tenha dado a recolher estas porções de borracha, acho um exagero! Até porque para os bebés é indiferente! Para eles não interessa se a borracha é de verdade ou não... Só lhes interessa que quando berram, a chucha está lá. à espera. Limpa e preparada para chuchar.
O problema é que os tipos que ganham dinheiro a fazer chuchas, (descobri no outro dia que são os mesmo que fazem os preservativos por isso cobrem todo o espectro relativo à paternidade ou à forma de a evitar) sabem que para um pai recente, a chucha do seu bebé é um artigo tão importante como um bom relógio, uma caneta Waterman ou um anel de brilhantes. E abusam!
Tal como os que fazem as roupas, as botas, os carrinhos, as cadeiras, as banheiras, as fraldas... É uma autêntica sociedade secreta de pessoas que sabem que os pais estão à sua mercê!
Se eu soubesse o que sei hoje, em vez de ter investido numa carreira criativa tinha metido as minhas economias numa loja para bebés... Pelo menos assim as chuchas eram de borla!

quarta-feira, março 24, 2004

Hora da papa 

Arma-se a cadeira. Controla-se o volume da aparelhagem. Coloca-se o CD com as músicas de embalar. O cenário está pronto. Aquece-se o prato, prepara-se o biberão com a água, a colher especial, os guardanapos de papel... Está tudo a postos. Pega-se na criança. É agora. Começa roda viva. Ele já pressentiu o que se aproxima. Começa a chorar. E nós começamos a coreografia, ensaiada e representada diariamente... Com duas representações ao fim de semana. É a Hora da Papa.
Comer é uma necessidade básica. E os bebés sabem isso perfeitamente. Até aos quatro meses o sistema é muito simples. De duas em duas horas... Ou de três em três para os pais felizardos, abrem as goelas e avisam ao mundo e aos vizinhos do andar do lado, de cima e de baixo: «TENHO FOME!». O que em linguagem de bebés se traduz por um choro continuado e estridente, com mais ou menos dois minutos.
Os pais correm a preparar o biberão... Ou então, a mãe respira fundo, senta-se o mais confortável possível e despe a camisola. Dar de mamar é um dos momentos mais bonitos da maternidade. Mas um dos mais duros.
A partir dos quatro meses as coisas complicam-se. É a altura de começar a dar a sopa e a papa. O problema é que ninguém explicou ao bebé porque é que tinha de mudar de hábitos alimentares... E ele queixa-se. Começa a luta!
Pai e mãe transformam-se em cantores, saltimbancos, equilibristas, prestigitadores... Uma parafernália de funções com um único objectivo. Dar a papa ao bebé.
Alguns colaboram. Têm apetite. Outros, são autênticos terroristas. Não comem, cospem tudo, vomitam e fazem a vida negra aos pobres pais. Possivelmente são esses que, mais tarde, só vão a restaurantes finos e abominam fast food... Esquisitos, desde que nascem.
O meu filho é um bom comedor. Mas nem por isso torna a hora da papa mais relaxante. Mesmo depois de lhe comprarmos uma cadeira de papa que rivaliza com o nosso sofá da Habitat em conforto e preço! Há sempre uma coisa qualquer com que ele embirra. Ou são os guardanapos, ou é o biberão, ou a sopa que não lhe é servida na velocidade que ele deseja (uma colher a cada meio segundo!). Então se lhe mostramos a fruta antes de terminar o prato principal, está tudo perdido!
Mas as coisas até têm corrido bem. Conheço casos muito piores... Muito mais dramáticos. É a felicidade de se ser pai... Há sempre um pai que sofreu mais que nós. Bem... Está na hora... Preparar... Prontos... Aí vamos nós outra vez.

Eles são mesmo livres 

Não sei se ainda há algum pai que acha que controla os filhos. Mas eu, há muito tempo que perdi qualquer veleidade em controlar o meu. Nascemos para ser impotentes. E o melhor é irmo-nos habituando. Desde que aquele espermatozóide mais audaz deixou o nosso corpo, até que o puto de 18 anos nos vem pedir a chave do carro para sair com a namorada, passam qualquer coisa como 9 460 800 horas, mais coisa menos coisa, e cada uma dessas horas é dedicada a uma só coisa. A celebração da nossa impotência.
Não os controlamos quando querem dormir. Ou não querem (como vem sendo o caso do meu filho). Não controlamos se têm fome, se estão doentes, se estão a respirar. Não os controlamos, ponto. Se lhes queremos dar miminhos, adormecem e ferram-se a dormir. Se queremos passar o resto da noite a dar miminhos à mãe, acordam, cheios de energia e querem ir brincar para o chão do quarto.
Depois são os dentes. Só crescem quando eles querem. E as primeiras palavras. Só as dizem quando bem lhes apetece.
Com o meu filho é ainda mais caricato. Sabe dizer adeus e bater palminhas. Um amor! Mas nunca, NUNCA, o faz a pedido. Já no outro dia, foi preciso apenas um exemplo para aprender a dar com uma garrafa de litro e meio de água na cabeça do pai!
Só aprendem a andar quando lhes é mesmo necessário, e a mesma coisa para o comer sozinhos, andar de bicicleta, fazer contas à mesada... Enfim...
O Kahlil Gibran, que era Libanês e escreveu um livro entitulado «O Louco» (vá-se lá saber porquê), escreveu às mães um poema que a minha progenitora fez questão de afixar na parede do meu quarto de criança. Numa das estrofes, Gibran garante: «Teus filhos não são teus filhos, são filhos e filhos da vida, anelando por ti própria». É óbvio que usei muitas vezes esta frase para dizer à minha mãe que se não ia arrumar o quarto é porque a Vida não me tinha mandado arrumar nada... E ela é que era a minha mãe! Mas o poema continua e tem uma metáfora, que não sendo muito original, é certeira, no sentido literal do termo: é qualquer coisa como... A mãe é o arqueiro e os filhos as setas. E a mestria da mãe é a de ter a pontaria de apontar o caminho de vida certo à seta que acaba de lançar.
Ou seja... Não temos mesmo hipótese. Eles são livres. E nós só podemos contemplar a sua liberdade. Mas isso não tem de ser mau. Mesmo que sejam 5 da manhã de um dia de trabalho e o vosso filho esteja a bater palminhas porque a muito ensonada mãe acaba de lhe trazer um biberão cheio de leite e ele grite a plenos pulmões: «DÁ PAPA, Mamã!»... Putos...


segunda-feira, março 22, 2004

Papa ou papá 

Não há coisa que dê mais orgulho a um pai que ouvir a palavra «Papá» sair da boca do seu filhote de seis meses. No meu caso, foi um momento único. Porque durou dez segundos. O meu filho disse-o, com todas as letras: «Papá» Ou pelo menos foi assim que eu o ouvi. Dez segundos depois percebi tudo. Estava a olhar para uma tigela de Cerelác com um olhar guloso. A palavra era «papa» e não a desejada «papá». Este episódio frustrante fez-me pensar se não haveria uma relação directa entre as duas palavras. E se, mais ainda, «mama» e «mamã» não teria exactamente a mesma relação. No fundo, a proximidade é util. Um bebé aprende depressa que comida pode ser referenciada por estes dois vocábulos. E percebe que se os repetir, causa nos progenitores uma reacção de felicidade, que aumenta as possibilidades de conseguir o que quer: Comida fora de horas! Bem. Não sei se é verdade. Mas com o meu filho funciona!

Um estranho chamado Pai 

A primeira vez que me senti respeitado como pai foi no Hospital da Cruz Vermelha, quando o meu filho nasceu, faz agora um ano. Parece que é prática comum, mas só ouvi contar àqueles que tiveram os filhos em hospitais privados: O pai é o primeiro a dar banho e a mudar as fraldas à criança. É o primeiro a pegar na criança ao colo mal ela nasce... e se o parto for normal, é quem corta o cordão umbilical e põe o bebé neste mundo.
Dentro daquele espaço esterilizado, o pai é a figura importante. Deve estar preparado para ajudar a mãe e o bebé.. e acima de tudo tem um lugar. Tem O lugar.
Mas até lá chegar... E depois de sair da maternidade... O pai é sempre a figura descartável. Mais grave que isso. Ninguém espera que ele lá esteja.
Se comete a veleidade de saber mudar as fraldas, sossegar uma tosse, dar um biberão, trocar de roupa ou embalar a criança. É um espanto. Se acompanhou a mãe a todas as ecografias, às aulas de preparação para o parto e em caminhadas às duas da manhã, quando a mãe está com azia e não consegue dormir... Então, passa a ave rara.
A sociedade não foi feita a pensar nos pais. As mulheres... Sim, porque 50 por cento da culpa é delas. Reuniram-se em torno da maternidade e criaram uma redoma que protege a grávida, e depois a mãe, e não deixam o pai entrar.
Os homens... Os culpados dos restantes 50 por cento. Adoptaram a postura do jovem imaturo. Enquanto a criança não nasce preferem não pensar nisso. Vivem de forma diletante. Até parecem mais novos. Mais descontraídos. O anúncio da paternidade torna-os mais alegres e desbragados.
Quando a criança nasce, muda tudo. Envelhecem 30 anos. Tornam-se sisudos. A falta de sono não ajuda. Reclamam quando o bebé chora, passam-no à mãe se ele faz cocó e continuam a agir como se nada tivesse mudado. Isto até haver um problema. Porque aí são céleres a atacar e a tomar medidas drásticas.
Mas há excepções. Há pais que participam. Pais que se preocupam e pais que se comovem. Há pais que fazem questão de estar presentes em todos os momentos dos filhos, pais que assumem as tarefas que tradicionalmente eram das mães. Não são excepcionais, não são aves raras e nem sequer são raros. Mas ficam sempre esquecidos, são sempre olhados de lado.
Para esses, a paternidade tem um significado especial. A segregação de que são alvo é uma agressão. Ninguém pensa neles. E eles não gritam. A não ser quando sentem necessidade.

Baby Blues 

Poucos livros me conquistam à primeira. Mas a série de Banda desenhada «Baby Blues», de Jerry Scott e Rick Kirkman apanhou-me desprevenido. Justiça seja feita, foi a minha mulher que me ofereceu o primeiro volume, no dia do Pai. E foi o Mário Botequilha que primeiro lhe falou dos «Baby Blues».
O tema não podia ser mais simples. A Wanda e o Derryl McPherson são pais de primeira viagem. E contam-nos, página após página, o dia-a-dia da aventura de ter um filho. Actualmente, a série vai avançada. E os McPherson já têm dois rebentos. No livro que estou a ler, a história ainda mal começou.
A verdade de cada tira é tão avassaladora que não há outro remédio senão rir. Scott e Kirkman são génios. E retratam a paternidade de uma forma tão exacta quanto crua.
Estou apaixonado e e risco de me tornar um comprador compulsivo dos álbuns.
Bom. Lá se vai o dinheiro para o leite em pó do meu filho… Mas pelos menos, da próxima vez que acordar às 5 da manhã com ele a berrar e a bater palmas, (suspeito que o puto está regulado pelo fuso horário de Praga!) vou poder relaxar a ler algumas das tiras do Baby Blues. Abençoados sejam!

Das revistas para Pais 

Porque é que as revistas para pais são todas dirigidas por mulheres? Ou melhor... porque é que não há nenhuma que seja dirigida por um homem? Será que é um cargo demasiado feminino? Ou será que a paternidade só existe quando se aproxima o dia 19 de Março? Ou pior... Será que toda a gente, incluindo os editores dessas publicações, julga que um homem não seria capaz de dirigir uma revista sobre pais e filhos?
Os homens estão reduzidos ao lugar de especialistas. São pediatras, psicólogos, nutricionistas. Salvo a honrosa excepção da «Pais e Filhos», não há homens a escrever sobre a experiência de ser pai.
Mas a verdade é que são os pais que compram estas revistas e que as lêem com mais atenção. Porque são eles que têm mais dúvidas, que se sentem mais sós. Que não conversam com os seus colegas de trabalho sobre os seus medos e as suas angústias. Vá lá a gente entender isto.

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