sexta-feira, março 19, 2004
Ser Pai
Não gosto de definições. Sempre que é preciso definir alguma coisa prefiro procurar as palavras de um poeta que tenha conseguido sintetizar o conceito num par de frases inesquecíveis. Os dicionários definem pai como a origem. Mas eu sempre considerei um dicionário como o grande ditador da linguagem. E não gosto de ditadores. Mas a linguagem às vezes ajuda. Um pai faz um filho. A mãe tem o filho. Um pai faz. Mas não tem. Somos a origem. E depois? Acredito que queiramos ser a margem e a nascente do rio que brotou de nós. E acredito que não queiramos estar sozinhos nessa viagem. Ser pai é muito mais que uma definição. Mas é uma tarefa solitária. Ou tornou-se solitária. Ser pai. Ser. A paternidade transforma um homem. Muda-o. Mas é preciso ser a mudança. Um homem nunca mais é o mesmo depois de ser pai. Mesmo que não queira mudar. Ser pai, é ser homem, na plenitude da masculinidade e da feminilidade. Ser pai é ser maior do que os homens. Ser pai é ser poeta. É ser.
A mãe
A mãe é o alibi perfeito. É ela que tem a responsabilidade de ter tudo em ordem. É ela que tem de ter a comida pronta, a roupa do bebé passada a ferro, as fraldas contadas, os dodots, os gorros, os casacos... É à mãe que se exige tudo. É à mãe que não se perdoa nada. A mãe é soberana. É a chata de serviço. A mãe, às vezes, é quase mãe do pai. Mas há só uma...
19 de Março
Há várias coisas que me irritam. Mas o dia 19 de Março é uma das que me tiram do sério! Bom, também me irrita o dia da Mãe, o da Mulher, o dia da Música, o dia do Ambiente. De facto, o que me irrita é que se façam dias especiais para coisas universais. Como ser Pai.
O que me irrita é que no dia Pai, nesse dia, todos nos olham de forma condescendente. Nesse dia, todos nos fazem uma vénia. E até nos sorriem. Dedicam-nos anúncios e campanhas. Somos os maiores. Mas não passa disso. Somos o alvo do consumo. Mas não há um único momento em que alguém pare para nos perguntar: O que é ser pai? Provavelmente a maioria não saberia responder. A triste verdade é que se perguntarem a um homem o que é ser pai, em 90 por cento dos casos a resposta sai dentro do estereotipo, e poucas vezes com o recurso a frases que envolvam emoções.
Para a maioria, um pai tem de ser como um rochedo, como um porto de abrigo. Não pode chorar, não pode ceder e muito menos fraquejar. Um pai não sabe mudar fraldas, não dá de comer à criança. Está na rua a trabalhar, está nos estádios de futebol e nos cafés. E quando a criança faz 6 anos, tira-o debaixo das saias da mãe e introduz o petiz ao mundo dos homens.
É esta imagem que prevalece sempre. O pai está reduzido a uma figura de estilo.
Não preciso de um dia do pai, obrigado. Estamos lá todos os outros dias do ano. Se querem fazer alguma coisa de especial neste dia, por favor, não nos chateiem.
O que me irrita é que no dia Pai, nesse dia, todos nos olham de forma condescendente. Nesse dia, todos nos fazem uma vénia. E até nos sorriem. Dedicam-nos anúncios e campanhas. Somos os maiores. Mas não passa disso. Somos o alvo do consumo. Mas não há um único momento em que alguém pare para nos perguntar: O que é ser pai? Provavelmente a maioria não saberia responder. A triste verdade é que se perguntarem a um homem o que é ser pai, em 90 por cento dos casos a resposta sai dentro do estereotipo, e poucas vezes com o recurso a frases que envolvam emoções.
Para a maioria, um pai tem de ser como um rochedo, como um porto de abrigo. Não pode chorar, não pode ceder e muito menos fraquejar. Um pai não sabe mudar fraldas, não dá de comer à criança. Está na rua a trabalhar, está nos estádios de futebol e nos cafés. E quando a criança faz 6 anos, tira-o debaixo das saias da mãe e introduz o petiz ao mundo dos homens.
É esta imagem que prevalece sempre. O pai está reduzido a uma figura de estilo.
Não preciso de um dia do pai, obrigado. Estamos lá todos os outros dias do ano. Se querem fazer alguma coisa de especial neste dia, por favor, não nos chateiem.
O Cocó
Se faz, é porque faz pouco, ou muito. Se não faz, é uma desgraça. A vida de um pai, desde que o filho nasce, passa a ser regida pelos intestinos dos filhos. Pode parecer nojento, mas o cocó é um dos factores mais importantes, centrais, dos primeiros anos da paternidade. E não é só porque gastamos uma verdadeira fortuna em fraldas.
A minha experiência com cocós, começou logo na primeira semana de paternidade. Ao quarto dia de vida, meu filho teve uma icterícia generalizada. É uma coisa normal. O bebé fica amarelo. Mas no caso do meu filho foi um bocadinho mais grave do que é normal e tivemos que o levar para o hospital. Uma das razões para o tom de pele oriental que o meu filho exibia era uma prisão de ventre persistente, que não o deixava limpar as toxinas que estava a produzir. Depois da crise passar, a capacidade do meu filho produzir cocós passou a ser uma prioridade. Se não os fazia, ficava em pânico. Lembrava-me das 24 horas passadas no Hospital das Descobertas e tinha suores frios. A minha mulher bem me tentava acalmar e lembrar que a ciência inventou uma coisa chamada Bebé Gel que ajuda os recém nascidos a fazerem cocós grossos e fétidos. Mas eu ficava em pânico na mesma. Estava refém das suas fraldas e do conteúdo das mesmas. É claro que, passados uns meses, o meu filho ficou com diarreia, e aí a situação inverteu-se. Já não queria que ele produzisse, mas que retivesse.
Hoje em dia, a conversa dos cocós é diária. Quando o vou buscar ao infantário, ao fim do dia, recebo sempre como prenda a frase: «Comeu bem, esteve bem disposto e fez cocó!» Com um sorriso da auxiliar e uma cara de quem diz, «Está tudo OK!» Por uma ou duas vezes tive a tentação de responder: «Eu hoje também fiz cocó. E li um artigo da New Yorker sobre a Guerra do Golfo enqunto fazia! Já viu como sou intelectual?!». Mas acho que uma resposta deste calibre não ia ter a reacção esperada. E eu quero que continuem a tratar bem do meu filho.
A minha experiência com cocós, começou logo na primeira semana de paternidade. Ao quarto dia de vida, meu filho teve uma icterícia generalizada. É uma coisa normal. O bebé fica amarelo. Mas no caso do meu filho foi um bocadinho mais grave do que é normal e tivemos que o levar para o hospital. Uma das razões para o tom de pele oriental que o meu filho exibia era uma prisão de ventre persistente, que não o deixava limpar as toxinas que estava a produzir. Depois da crise passar, a capacidade do meu filho produzir cocós passou a ser uma prioridade. Se não os fazia, ficava em pânico. Lembrava-me das 24 horas passadas no Hospital das Descobertas e tinha suores frios. A minha mulher bem me tentava acalmar e lembrar que a ciência inventou uma coisa chamada Bebé Gel que ajuda os recém nascidos a fazerem cocós grossos e fétidos. Mas eu ficava em pânico na mesma. Estava refém das suas fraldas e do conteúdo das mesmas. É claro que, passados uns meses, o meu filho ficou com diarreia, e aí a situação inverteu-se. Já não queria que ele produzisse, mas que retivesse.
Hoje em dia, a conversa dos cocós é diária. Quando o vou buscar ao infantário, ao fim do dia, recebo sempre como prenda a frase: «Comeu bem, esteve bem disposto e fez cocó!» Com um sorriso da auxiliar e uma cara de quem diz, «Está tudo OK!» Por uma ou duas vezes tive a tentação de responder: «Eu hoje também fiz cocó. E li um artigo da New Yorker sobre a Guerra do Golfo enqunto fazia! Já viu como sou intelectual?!». Mas acho que uma resposta deste calibre não ia ter a reacção esperada. E eu quero que continuem a tratar bem do meu filho.